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segunda-feira, 7 de abril de 2014

Interface entre Jornalismo e Saúde: reconhecer para enfrentar

Caro colega jornalista. Hoje comemora-se duas datas importantes, Dia do Jornalista e Dia Mundial da Saúde. Portanto, um dia oportuno para refletirmos sobre o mundo do trabalho dos jornalistas em geral, que todos os dias sofrem com estresse e assédio moral no ambiente de trabalho e veem suas vidas ameaçadas pela violência no desempenho de suas funções nas ruas da cidade.

O Dia do Jornalista foi criado pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) em homenagem a Giovanni Battista Libero Badaró, médico e jornalista, que foi assassinado por inimigos políticos, no dia 22 de novembro de 1830, em São Paulo. Sua morte gerou um movimento popular que levou à abdicação de D. Pedro I, no dia 7 de abril de 1831. Assim, a data foi escolhida para marcar a fundação da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), por Gustavo de Lacerda, em 1908 e instituição, pela própria ABI, do Dia do Jornalista nas comemorações de um século da abdicação de D. Pedro I, em 1931.

Já o Dia Mundial da Saúde foi criado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1948, devido à preocupação de seus membros em manter o bom estado de saúde das pessoas em todo o mundo, e também alertar a todos sobre os principais problemas que podem afetar a população mundial.

Para a OMS, "saúde é o completo bem-estar físico, mental e social e não a simples ausência de doença", ou seja, não é apenas a ausência de doenças físicas e mentais que determinam se uma pessoa é ou não saudável. Hoje, sabe-se, que a saúde e qualidade de vida dependem de condicionantes e determinantes sociais, daí a necessidade de ações intersetoriais e integração das diversas políticas públicas, como Educação, Saúde, Habitação, Saneamento e Assistência Social etc., para garantir uma vida saudável à população.

O psicólogo, professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, Roberto Heloani, que desde 2003, investiga a interface entre saúde e a profissão jornalística, inicialmente, realizou uma pesquisa com jornalistas de São Paulo e Rio de Janeiro, que revelou um perfil preocupante sobre como vivem os jornalistas e por que adoecem. O trabalho ouviu dezenas de jornalistas, utilizando o método de pesquisa quantitativo e qualitativo, envolvendo profissionais de rádio, TV, impresso e assessorias de imprensa. Embora a amostragem envolva apenas dois Estados brasileiros, trata-se de uma situação que ocorre em todo o País.

Para se ter noção da situação, seguem trechos da entrevista concedida à jornalista Elaine Tavares e publicada no site do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, em julho de 2010, que retratam bem o que o jornalista vive hoje.

“Segundo Heloani “a mídia é um setor que transforma o imaginário popular, cria mitos e consolida inverdades. Uma delas diz respeito à própria visão do que seja o jornalista. Quem vê a televisão, por exemplo, pode criar a imagem deformada de que a vida do jornalista é de puro glamour”. A pesquisa deixa claro que, assim como a absoluta maioria dos jornalistas é completamente apaixonada pelo que faz, ao mesmo tempo está em sofrimento pelo que faz, o que na prática quer dizer que, amando o jornalismo, eles não se sentem fazendo esse jornalismo que amam, sendo obrigados a realizar outra coisa, a qual odeiam. Daí a doença!”.

“Heloani observou que as empresas de comunicação atualmente tendem a contratar pessoas mais jovens, provocando uma guerra entre gerações dentro das empresas. Como os mais velhos não tem mais saúde para acompanhar o ritmo frenético imposto pelo capital, os patrões apostam nos jovens, que ainda têm saúde e são completamente despolitizados. Porque estão começando e querem mostrar trabalho, eles aceitam tudo e, de quebra, não gostam de política ou sindicato, o que provoca o enfraquecimento da entidade de luta dos trabalhadores”.

“Um exemplo disso é o aumento da multifunção entre os jornalistas mais novos. Eles acabam naturalizando a ideia de que podem fazer tudo, filmar, dirigir, iluminar, escrever, editar, blogar etc… A jornada de trabalho, que pela lei seria de 5 horas, nos dois estados pesquisados não é menos que 12 horas. Há um excesso vertiginoso. Para os mais velhos, além da cobrança diária por “atualização e flexibilidade” há sempre o estresse gerado pelo medo de perder o emprego. Conforme a pesquisa, os jornalistas estão sempre envolvidos com uma espécie de “plano B”, o que pode causa muitos danos a saúde física e mental. Não é sem razão que a maioria dos entrevistados não ultrapasse a barreira dos 20 anos na profissão. “Eles fatalmente adoecem, não agüentam”.”

“O assédio moral que toda essa situação causa não é pouca coisa. Colocados diante da agilidade dos novos tempos, da necessidade da multifunção, de fazer milhares de cursos, de realizar tantas funções, as pessoas reprimem emoções demais, que acabam explodindo no corpo. “Se há uma profissão que abraçou mesmo essa ideia de multifunção foi o jornalismo. E aí, o colega vira adversário. A redação vive uma espécie de terrorismo às avessas”. Conforme Heloani, esta estratégia patronal de exigir que todos saibam um pouco de tudo nada mais é do que a proposta bem clara de que todos são absolutamente substituíveis. A partir daí o profissional vive um medo constante, se qualquer um pode fazer o que ele faz, ele pode ser demitido a qualquer momento. “Por isso os problemas de ordem cardiovascular são muito frequentes. Hoje, Acidentes Vasculares Cerebrais (AVCs) e o fenômeno da morte súbita começam a aparecer de forma assustadora, além da sistemática dependência química”.

“O jornalista ganha muito mal, vive submetido a um ambiente competitivo ao extremo, diante de uma cotidiana falta de estrutura e ainda precisa se equilibrar na corda bamba das relações de poder dos veículos. No mais das vezes, estes trabalhadores não tem vida pessoal e toda a sua interação social só se realiza no trabalho. Segundo Heloani, 80% dos profissionais pesquisados tem estresse e 24,4% estão na fase da exaustão, o que significa que de cada quatro jornalistas, um está prestes a ter de ser internado num hospital por conta da carga emocional e física causada pelo trabalho. Doenças como síndrome do pânico, angústia, depressão são recorrentes e há os que até pensam em suicídio para fugir desta tortura, situação mais comum entre os homens”.

A pesquisa constatou que nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, 93% dos jornalistas não têm carteira assinada ou contrato. Isso é outra fonte de estresse. Segundo o pesquisador, além da insegurança laboral, o trabalhador ainda é deixado sozinho em situações de risco nas investigações e até na questão judicial. Com todas essas dificuldades, os jornalistas também não têm tempo para a família, para ler, para o lazer, não fazem atividades físicas, mas têm a doença como conseqüência natural.

De acordo com matéria publicada no Portal Imprensa, em 11 de março de 2013, numa pesquisa mais recente concluída em 2012, com mais de 250 jornalistas, aprofundando temas como saúde mental, identidade e subjetividade, e incidência de assédio moral e sexual, Heolani concluiu que nos últimos dez anos, houve aumento, entre os jornalistas, das incidências de depressão, infidelidade conjugal e uso de drogas, principalmente, cocaína e anfetamina, além do fenômeno que ele chama de "naturalização do assédio".

Ao Portal Imprensa, Heloani disse que "hoje, no país, há cerca de seis grandes grupos de comunicação. Ou seja, o jornalista precisa ter muita coragem para fazer uma denúncia formal de assédio se quiser permanecer no mercado. Além disso, trocar de profissão, quando desejado, não é fácil.”

Outro obstáculo apontado pelo pesquisador é a distância entre a experiência real e a representatividade social da profissão. "Enquanto a imagem do jornalista é idealizada e positiva na sociedade, sua vivência diária é precarizada. Isso os torna mais inseguros e frustrados".

Para Heloani, as saídas para os jornalistas enfrentarem essa situação não podem ser individuais, porque são insuficientes. As ações têm que ser coletivas. Como disse na época o então presidente do sindicato catarinense, Rubens Lunge, “é só amparados pelo Sindicato, em ações coletivas, que os jornalistas encontrarão forças para mudar esse quadro”.

Com certeza, todos nós nos identificamos com as situações ralatadas pelo pesquisador. E isso não se restringe aos jornalistas de redação, os assessores de imprensa também têm que se virar para dar conta de tanto trabalho em mais de uma empresa ou instituição, trabalho esse que se estende aos finais de semana em casa, para aumentar a renda da família.

Então, como jornalista, creio que o primeiro passo para enfrentarmos e revertermos essa situação, é reconhecer que somos trabalhadores como outro qualquer e que é assim que vivemos o nosso dia a dia.

Como sindicalista e diretora do Sinjor-PA e militante da Saúde, digo conquistar melhores salários é importante, mas penso que precisamos também avançar muito mais nas cláusulas sociais e de saúde dos acordos coletivos, porque ter um plano de saúde pago pela empresa significa pouco, já que, na verdade, é um plano de doença que só pode ser usado quando o profissional ou algum dependente seu está doente.

Com o apoio da categoria unida e mobilizada e um Sindicato fortalecido, vamos lutar para incluir ações de prevenção de doenças e promoção da saúde física e mental nos próximos acordos coletivos. Faça sua parte, sindicalize-se. O Sinjor-PA está de portas abertas. A hora é agora. Jornalista Vale Mais!



Roberta Vilanova

Jornalista Diplomada Reg.838 DRT-PA

Tesoureira/Sinjor-PA

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